Como criar um futuro diferente se todo mundo é igual?
Por natureza, startups são movidas pela combinação entre inovação, escala e respostas a dores da sociedade. O alinhamento a um cenário cada vez mais orientado pela equidade racial, de gênero, etária e orientação sexual, no entanto, ainda permanece como um longo caminho a ser percorrido no ecossistema de inovação brasileiro. “Trabalhamos com inovação, só́ que quando a gente bate no que o fundador faz, ele faz SaaS, B2B, acabou de se formar em Stanford, é homem, tem 35 anos, é hétero, cis. Não estamos mais inovando em nada, né?”, afirma um agente de ecossistema (de identidade não-revelada), entrevistado pelo Panorama do Ecossistema de Startups no Brasil, conduzido pela Bain & Company.
Os dados e estudos levantados no setor reforçam a falta de diversidade entre as startups do país. Segundo o Mapeamento de Comunidades 2020, da ABStartups, apenas 12,6% de todas as startups nacionais são fundadas por mulheres. Os números são ainda menores nos recortes referentes à população negra, que corresponde a apenas 5,8% dos founders. Dos atuais unicórnios brasileiros, somente a Madeira Madeira, co-fundada por Robson Privado, possui um representante negro no quadro de sócios originais. Quando se trata de empregabilidade, o cenário não é diferente: apenas 4,5% das startups empregam pessoas transexuais e 6,7%, funcionários PCD.
Tradicionalmente celebrado por alavancar alguns dos negócios mais inovadores do país, o venture capital também vem sendo apontado como um fator contribuinte para a falta de diversidade entre as startups. Embora estudos mostrem que a falta de diversidade impacta inclusive no desempenho do negócio, muitos investidores terminam – conscientemente ou inconscientemente – dando preferência ao seu chamado ingroup na hora de fazer suas apostas. “Quando a startup vem com indicação, ela é vista de forma diferente”, diz outro entrevistado pela Bain & Company. “Chamamos 99% delas para uma conversa inicial. Já́ se vier sem indicação, às vezes chamamos, às vezes não.”
Essa lógica baseada no networking, background e redes de FFFs (friends, family and fools) aparece na disparidade dos aportes recebidos pelas empresas: menos de 1% das empresas fundadas por negros recebe aportes financeiros. No caso das operações criadas exclusivamente por mulheres, o número gira em torno de 1%, segundo o estudo da Bain & Company. Das empresas que se tornaram unicórnios brasileiros até 2020, 93% foram fundadas por homens, grande parte deles com graduação pela USP (43%) e pós-graduação em Harvard ou Stanford (40%).
Trabalhar a diversidade na origem e no desenvolvimento das próprias startups se mostra como uma estratégia cada vez mais crucial para a criação de um ecossistema de inovação aberto e inclusivo. Assim como o investimento em acompanhamento de métricas e iniciativas de educação que ajudem a reduzir a desigualdade sistêmica de acesso a conhecimento que existe no país. Um desafio e tanto para a comunidade de investidores e empreendedores brasileiros.